A advocacia, como função essencial à administração da Justiça, fundamenta-se em pilares éticos inegociáveis que garantem não apenas a dignidade da profissão, mas também a própria realização da justiça.
Entre estes pilares, destaca-se a inviolabilidade da comunicação entre advogados, tema que merece especial atenção diante dos desafios contemporâneos impostos pela era digital.
O Fundamento Legal da Inviolabilidade
O Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei nº 8.906/94), em seu artigo 7º, inciso II, estabelece como direito do advogado “a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia”.
Este dispositivo não representa mero privilégio profissional, mas garantia fundamental para o exercício da advocacia e, por conseguinte, para a própria administração da justiça.
A Dimensão Ética da Questão
O Código de Ética e Disciplina da OAB reforça este entendimento ao dispor, em seu artigo 6º, que “é defeso ao advogado expor os fatos em Juízo falseando deliberadamente a verdade ou estribando-se na má-fé“.
A utilização não autorizada de mensagens privadas trocadas entre advogados configura não apenas violação à confidencialidade, mas também comportamento desleal que macula a dignidade da profissão.
Jurisprudência e Entendimentos Consolidados
O Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/SP, em diversos julgados, tem reiteradamente condenado a utilização não autorizada de comunicações entre advogados, a constituir-se infração ética.
Ilustrando:
E-MAIL E OUTROS MEIOS DE COMUNICAÇÃO – TRATATIVAS ENTRE ADVOGADOS – USO POSTERIOR EM PROCESSO JUDICIAL – INFRAÇÃO ÉTICA – DEVER DE URBANIDADE E SIGILO – PRINCÍPIOS DA LEALDADE E DA BOA-FÉ. A utilização de produto da materialização de comunicação entre advogados em benefício de um dos interlocutores (ou de seu cliente) é reprovável e configura infração ética na medida em que contraria o dever de urbanidade na relação entre colegas (artigo 27), o dever de sigilo (artigos 35 e seguintes), assim como o dever de lealdade (artigo 31), e de atuação com honestidade, decoro, veracidade, lealdade, dignidade e boa-fé exigida pelo inciso II do artigo 2º, todos do Código de Ética. Excepcionam-se de tal vedação (i) as circunstâncias excepcionais previstas no artigo 37 do Código de Ética; (ii) a utilização de material que se configure como fato jurídico relevante para o deslinde da ação, de modo que a sua não utilização poderia configurar como a perda de uma chance ao seu cliente; e, (iii) as comunicações formais em nomes dos clientes com finalidade expressa de utilização posterior (exemplo como notificações, contra notificações, confirmação de recebimento de documento, etc.), em que a própria natureza do ato assim se apresenta. Podem ser consideradas como materialização atas, minutas, cartas, e-mails, mensagens instantâneas, gravação telefônica, entre outros. Precedentes: E-1.998/99; E-3.766/2009; e, E-5.575/2021; E-5.629/2021. Proc. E-5.734/2021 – v.u., em 28/04/2022, parecer e ementa da Rel. Dra. FERNANDA ABREU TANURE, Rev. Dra. CAMILA KUHL PINTARELLI – Presidente Dr. JAIRO HABER.
EXERCÍCIO PROFISSIONAL – UTILIZAÇÃO POR UM ADVOGADO EM JUÍZO DE CÓPIAS DE MENSAGENS E DEMAIS MEIOS DE COMUNICAÇÃO TROCADAS COM O ADVOGADO DA PARTE CONTRÁRIA – ATITUDE DESLEAL QUE TRADUZ ESPERTEZA E NÃO DEVE SER PRESTIGIADA OU TOLERADA – INFRAÇÃO ÉTICA. A juntada em processo judicial de mensagens trocadas entre colegas por mensagem ou qualquer outro meio eletrônico sem o conhecimento e/ou autorização do outro colega, na tentativa de convencer o Juiz sobre a sua tese, configura desrespeito aos deveres de urbanidade, lealdade, sigilo e afronta a dignidade da profissão. (Artigos 27, 35 e seguintes e 31 do CED) Proc. E-5.817/2021 – v.u., em 28/04/2022, parecer e ementa da Rel. Dra. MARCIA DUTRA LOPES MATRONE, Rev. Dr. ZANON ROZZANTI DE PAULA BARROS – Presidente Dr. JAIRO HABER.
Princípios Éticos e Legais Pertinentes
- Dever de Veracidade e Boa-fé: O Código de Ética e Disciplina da OAB estabelece que é vedado ao advogado “expor os fatos em Juízo falseando deliberadamente a verdade ou estribando-se na má-fé” (art. 6º). A apresentação de comunicações privadas sem consentimento pode ser interpretada como uma tentativa de manipular o contexto, comprometendo a veracidade dos fatos.
- Inviolabilidade das Comunicações: O Estatuto da Advocacia assegura ao advogado a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia (art. 7º, II). Portanto, a divulgação não autorizada de mensagens entre advogados infringe esse dispositivo legal.
- Princípio da Cooperação no Processo Civil: O Código de Processo Civil dispõe que “todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva” (art. 6º). A utilização desleal de comunicações privadas contraria esse princípio, prejudicando a confiança mútua necessária ao bom andamento processual.
Conclusão
A utilização de mensagens privadas entre advogados como prova em processos judiciais, sem a devida autorização, é uma prática que fere princípios éticos fundamentais da advocacia.
Tal conduta desleal traduz-se em esperteza que não deve ser prestigiada ou tolerada, pois desrespeita os deveres de urbanidade, lealdade, sigilo e afronta a dignidade da profissão.
É imperativo que os advogados atuem com integridade, respeitando as normas éticas e legais que regem a profissão, assegurando, assim, a confiança indispensável ao adequado funcionamento do sistema de justiça.