I. INTRODUÇÃO
O deferimento tácito da justiça gratuita é um instituto jurídico de importância prática inegável para o acesso à justiça. Ele ocorre quando, diante da inércia do Judiciário em analisar o pedido de gratuidade, presume-se o acolhimento do benefício, garantindo à parte hipossuficiente o exercício do contraditório e da ampla defesa sem encargos financeiros.
Tal mecanismo encontra respaldo direto no art. 5º, incisos XXXV e LXXIV da Constituição Federal e nos arts. 98 a 100 do Código de Processo Civil, além de estar pacificado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que vem reconhecendo reiteradamente a validade da concessão tácita do benefício.
II. FUNDAMENTAÇÃO LEGAL DO DEFERIMENTO TÁCITO DA JUSTIÇA GRATUITA
2.1. Presunção legal e dever de manifestação judicial
Nos termos do art. 99, §§2º e 3º do CPC, a alegação de insuficiência feita por pessoa natural goza de presunção de veracidade. O juiz apenas poderá indeferi-la se houver elementos objetivos nos autos, devendo previamente intimar a parte para complementação. A omissão do magistrado, portanto, não pode ser usada em desfavor da parte requerente.
2.2. Efeitos jurídicos da omissão
A ausência de decisão expressa sobre o pedido enseja o deferimento tácito da justiça gratuita, autorizando, por exemplo, a interposição de recursos sem o recolhimento do preparo, a prática de atos processuais sem custas e o prosseguimento do feito com a suspensão da exigibilidade de despesas processuais.
III. JURISPRUDÊNCIA DO STJ: DEFERIMENTO TÁCITO CONSOLIDADO
A Corte Especial do STJ já sedimentou a tese, conforme julgado paradigmático no AgRg nos EAREsp 440.971/RS, de que:
“A omissão do julgador atua em favor da garantia constitucional de acesso à jurisdição e de assistência judiciária gratuita […], presumindo-se o deferimento do pedido […].“
Outros precedentes relevantes incluem:
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EAREsp 731.176/MS e EAREsp 2.506.419/SP: ausência de manifestação judicial implica reconhecimento automático do benefício.
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EDcl no AgInt no REsp 1.561.067/RS e AgInt no RMS 60.388/TO: reforçam que a inércia judicial não pode ser interpretada como indeferimento.
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AgInt no REsp 1.998.081/DF e EDcl no AgInt no AREsp 1.249.691/SP: reafirmam que o deferimento tácito produz efeitos ex nunc e não exige reiteração.
IV. APLICAÇÃO UNIFORME ENTRE AS TURMAS DO STJ
As cinco Turmas do STJ aplicam de forma coesa a tese do deferimento tácito:
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1ª Turma: EDcl no AgInt no REsp 1.561.067/RS
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2ª Turma: AgInt no RMS 60.388/TO, EDcl no AgInt no AREsp 2.148.862/MG
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3ª Turma: AgInt no AREsp 486.395/ES
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4ª Turma: AgInt nos EDcl no AREsp 1.785.252/SP
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5ª Turma: AgRg no AREsp 2.550.212/SP (ação penal)
V. CONSEQUÊNCIAS PRÁTICAS DO DEFERIMENTO TÁCITO
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Dispensa de preparo recursal e custas processuais
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Eficácia ex nunc (não retroage)
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Persistência do benefício em todas as instâncias
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Desnecessidade de reiteração do pedido
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Inexistência de preclusão, conforme AgInt nos EDcl no AREsp 1.785.252/SP
Conclusão
O deferimento tácito da justiça gratuita é uma garantia jurídica e constitucional que visa assegurar o pleno acesso à jurisdição. A jurisprudência do STJ é categórica: a omissão judicial implica o reconhecimento do benefício. É dever dos operadores do Direito, especialmente advogados e magistrados, zelar para que tal garantia seja respeitada.