Validade da citação recebida por cônjuge: A Posição dos Tribunais

A validade da citação recebida por cônjuge é um tema pacificado na jurisprudência. Tribunais, incluindo o STJ, entendem que o ato atinge sua finalidade se entregue no endereço correto do devedor. Introdução A citação é o ato processual que dá ciência ao réu sobre a existência de uma ação, sendo pressuposto de validade do processo. […]

Uma pessoa recebendo uma carta de citação com AR na porta de casa, ilustrando a validade da citação recebida por cônjuge.

Sumário

A validade da citação recebida por cônjuge é um tema pacificado na jurisprudência.

Tribunais, incluindo o STJ, entendem que o ato atinge sua finalidade se entregue no endereço correto do devedor.

Introdução

A citação é o ato processual que dá ciência ao réu sobre a existência de uma ação, sendo pressuposto de validade do processo.

Contudo, uma dúvida comum surge na prática forense: a citação postal (via Aviso de Recebimento – AR) é válida quando assinada por um terceiro, especialmente o cônjuge ou filho do citando?

Embora algumas decisões de primeira instância recusem o ato por “falta de pessoalidade”, a jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou-se em sentido oposto.

Este artigo analisa a validade da citação recebida por cônjuge quando esta é entregue no endereço residencial correto da parte, com base em precedentes reais.

A Validade da Citação Recebida por Cônjuge e a Instrumentalidade das Formas

O Código de Processo Civil (CPC) rege a citação postal para pessoas físicas em seu art. 248, § 1º.

Este dispositivo estabelece que, na citação pelo correio, a carta será registrada para entrega ao citando, exigindo sua assinatura no recebimento.

No entanto, a interpretação desse artigo não pode ser literal a ponto de invalidar um ato que claramente atingiu seu objetivo.

Aplica-se o princípio da instrumentalidade das formas (ou pas de nullité sans grief), onde não se declara nulidade sem prejuízo.

Se a carta foi entregue no endereço do réu e recebida por seu cônjuge, que reside no mesmo local, há uma “presunção relativa” de que o réu tomou conhecimento da ação.

A finalidade do ato—dar ciência da demanda—foi atingida.

A Posição Dominante do Superior Tribunal de Justiça (STJ)

Contrariando uma interpretação puramente formalista, o STJ possui jurisprudência “tranquila” no sentido de validar o ato citatório.

A Corte Superior entende que a citação postal, com aviso de recebimento, entregue no endereço correto do executado, é válida, mesmo que recebida por terceiros.

Este entendimento, visto em diversos julgados (como o AgInt no REsp 1.473.134/SP), pacificou a tese de que, chegando a carta ao destino correto, presume-se o conhecimento pelo réu.

Jurisprudência (STJ): “É tranquila a jurisprudência do STJ pela validade da citação postal, com aviso de recebimento e entregue no endereço correto do executado, mesmo que recebida por terceiros.” (Referência: AgInt no REsp 1473134 / SP, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJe 28/08/2017)

Consulte o julgado no Jusbrasil: STJ – AgInt no REsp 1473134/SP

A Jurisprudência Uníssona do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP)

O TJSP segue a mesma linha, considerando amplamente a validade da citação recebida por cônjuge.

Em julgamento (Agravo de Instrumento nº 2012397-91.2022.8.26.0000), a 27ª Câmara de Direito Privado afirmou que sua jurisprudência é “uníssona” ao reconhecer a validade do ato quando o AR é recebido pelo cônjuge que reside no mesmo endereço.

No caso, o tribunal considerou “mais seguro entender que o cônjuge – igualmente interessado no feito – teria entregado a carta de citação”.

Outros acórdãos reforçam essa visão:

  • Vínculos Familiares: A 27ª Câmara (AI 2237787-45.2023.8.26.0000) também destacou que a jurisprudência é “pacífica” quanto à validade do recebimento por pessoa com “vínculos familiares”.
  • Presunção de Ciência: A 11ª Câmara (AI 2148499-18.2025.8.26.0000) validou a citação recebida pelo cônjuge, que também era coexecutado no processo, reconhecendo a “presunção de ciência”.
  • Ação Anulatória Improcedente: O Colégio Recursal (Recurso Inominado Cível nº 1001872-70.2023.8.26.0311) manteve a improcedência de uma ação anulatória, pois o fato de o AR ter sido assinado pelo cônjuge no endereço correto “não tem o condão de macular o ato citatório”.
  • Finalidade do Ato: A 14ª Câmara (AI 2194290-44.2024.8.26.0000) proveu o recurso de um exequente, validando a citação assinada pelo cônjuge da devedora, que inclusive havia assinado comprovantes de recebimento dos produtos que originaram a dívida.

Consulte o julgado no Jusbrasil: TJ-SP – AI 2012397-91.2022.8.26.0000

Análise Prática: Familiar não é “Terceiro Estranho”

A validade da citação recebida por cônjuge repousa na presunção de que o familiar entregará o documento ao destinatário.

É crucial diferenciar o recebimento por um cônjuge, filho ou genitor—que compartilham o mesmo teto e, muitas vezes, interesses—do recebimento por um “terceiro estranho” (como um vizinho ou um funcionário de outra empresa), situação em que a nulidade seria mais provável.

O TJSP, no Agravo de Instrumento 2175595-86.2017.8.26.0000, fez uma analogia precisa ao art. 248, § 4º, do CPC.

Este dispositivo valida a citação entregue ao funcionário da portaria em condomínios edilícios.

O relator ponderou que, se a entrega ao porteiro (um terceiro) é válida, por analogia, a correspondência entregue na residência do citando “em mãos de sua cônjuge também”.

Ignorar essa presunção seria um formalismo excessivo, que prejudica a celeridade processual sem um ganho real de defesa, já que o ato atingiu sua finalidade.

É importante notar que existe jurisprudência minoritária em sentido contrário, que se apega à literalidade do art. 248, § 1º, e defende que a entrega deve ser pessoal ao citando, não se aplicando a presunção de ciência mesmo se recebida pelo cônjuge.

Contudo, essa não é a posição dominante ou mais recente dos tribunais superiores e do TJSP.

Conclusão

Embora o art. 248, § 1º, do CPC sugira a pessoalidade, a interpretação jurisprudencial moderna, pautada no princípio da finalidade, caminha para o reconhecimento da validade da citação recebida por cônjuge.

A posição pacífica do TJSP e a jurisprudência tranquila do STJ indicam que, se a carta citatória foi entregue no endereço correto do réu e recebida por um familiar próximo, o ato é hígido.

Presume-se que o membro da família entregou a correspondência ao destinatário.

Trata-se de uma presunção relativa, que pode ser derrubada por prova em contrário, mas que privilegia a boa-fé e a celeridade, evitando a repetição desnecessária de atos que já alcançaram seu objetivo.

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