A publicidade na advocacia é um tema de grande relevância, especialmente no contexto atual, em que os profissionais do Direito estão cada vez mais presentes nas mídias digitais.
Entretanto, o advogado deve observar rigorosamente os limites éticos estabelecidos pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ao se promover, sobretudo quando se autodenomina “especialista” ou “referência” em determinada área do Direito.
Este artigo aborda as implicações dessa prática, à luz do Código de Ética e Disciplina da OAB, de doutrina especializada e da jurisprudência aplicável.
1. O Código de Ética e Disciplina da OAB e a Publicidade na Advocacia
O artigo 39 do Código de Ética e Disciplina da OAB estabelece limites claros quanto à publicidade na advocacia, orientando que o advogado deve primar por discrição e moderação na promoção de seus serviços.
O referido dispositivo veda expressamente a utilização de meios de divulgação que possam induzir o público a erro ou que sejam considerados como captação indevida de clientela:
Art. 39. É vedado ao advogado: “II – divulgar ou deixar que sejam divulgadas listas de clientes e demandas sob seu patrocínio; III – insinuar-se para reportagens e declarações públicas; IV – abordar tema de modo a comprometer a dignidade da profissão e da instituição que integra.”
No que se refere à autodenominação de “especialista”, o Código de Ética, em consonância com o Provimento n.º 205/2021, permite que o advogado informe sua área de atuação, desde que essa comunicação seja feita com moderação e sobriedade, evitando qualquer forma de ostentação.
Esse provimento inovou ao permitir uma maior abertura para a publicidade do exercício da advocacia, mas, ao mesmo tempo, reafirmou que o uso da denominação “especialista” deve ser restrito aos advogados que possuam qualificação técnica reconhecida.
2. A Doutrina e a Publicidade na Advocacia
A doutrina especializada tem debatido amplamente sobre o tema da publicidade na advocacia. Maurício Gomm Santos argumenta que o advogado, ao realizar sua publicidade, deve observar dois princípios fundamentais: o princípio da discrição e o princípio da veracidade.
Ele destaca que a publicidade, embora permitida, não deve caracterizar-se como uma propaganda mercantilista, buscando respeitar a dignidade da profissão.
Outro doutrinador de grande relevância, Paulo Lôbo, em sua obra Comentários ao Código de Ética e Disciplina da OAB, ressalta que a publicidade advocatícia deve ser orientada pela sobriedade, sem promover concorrência desleal entre advogados. Lôbo adverte que o uso de termos como “referência” ou “especialista” sem a devida qualificação técnica é vedado, pois pode gerar falsas expectativas no público.
Assim, a doutrina é unânime ao afirmar que a autodenominação de “especialista” sem a comprovação formal de qualificação técnica é incompatível com os princípios que norteiam a advocacia, podendo ensejar processos disciplinares no âmbito da OAB.
3. Jurisprudência sobre o Tema
A jurisprudência do Tribunal de Ética e Disciplina (TED) da OAB reforça a necessidade de prudência na autodenominação do advogado como “especialista” ou “referência”. Em diversos julgados, o TED já se posicionou contrariamente à utilização de tais denominações sem comprovação, como podemos observar no seguinte precedente:
Ementa:“Processo Disciplinar Nº 1100923.00011097/2020-20 – por unanimidade EMENTA: TED Nº 1278/2021. PUBLICIDADE IRREGULAR. OFERTA DE SERVIÇOS. PUBLICIDADE CARACTERIZANDO OFERECIMENTO DE SERVIÇOS OU CAPTAÇÃO DE CLIENTELA. Publicação veiculada em sites/aplicativos e jornal de grande circulação, com a finalidade de captação de clientes, informando os meios de contato, sob título de “SOS MULTAS” e frases “Consulte um especialista”, “Foi Multado? Sim? Deixe quem está a mais de 10 anos no ramo cuidar disto para você” associada aos contatos do Representado. Caracterizada infração ético disciplinar aos artigos 34, inc IV, do EAOAB, e 7º, 39 e 40, inciso VI, do Código de Ética e Disciplina da OAB. PROCEDENTE a presente representação convertida em advertência, nos termos do artigo 36, parágrafo único, do EAOAB. Oitava Turma Julgadora TED/RS – Relator RAPHAEL KLASER – Porto Alegre, 14 de setembro de 2021″.
Além disso, o TED ressalta que o uso indevido desses termos pode configurar captação indevida de clientela, conforme previsto no art. 34, IV, do Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei n.º 8.906/1994), que tipifica como infração disciplinar “angariar ou captar causas, com ou sem a intervenção de terceiros”.
Isso ocorre quando o advogado, ao se autointitular de forma indevida, tenta induzir o público a contratá-lo sob a impressão de possuir expertise que não pode comprovar.
4. Conclusão
Diante do exposto, conclui-se que, embora o advogado possa anunciar suas áreas de atuação e divulgar seus serviços com maior amplitude após o Provimento n.º 205/2021, ele deve fazê-lo sempre com discrição, moderação e, acima de tudo, veracidade. A autodenominação de “especialista” ou “referência” sem a devida comprovação formal de qualificação técnica pode configurar infração ética, sendo vedada pelo Código de Ética e Disciplina da OAB.
O respeito aos limites éticos na publicidade não apenas preserva a dignidade da advocacia, mas também protege o público contra práticas que possam induzi-lo a erro. A atuação ética e transparente é fundamental para a manutenção da confiança da sociedade na advocacia e no sistema de Justiça.
Referências:
LOBO, Paulo. Comentários ao Código de Ética e Disciplina da OAB. São Paulo: Saraiva, 2020.
SANTOS, Maurício Gomm. A Publicidade na Advocacia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019.
Ordem dos Advogados do Brasil. Provimento n.º 205/2021. Ordem dos Advogados do Brasil. Código de Ética e Disciplina da OAB.
Jurisprudência: TED-RS, Processo Disciplinar Nº 1100923.00011097/2020-20.