A Coação na Audiência de Conciliação e a Violação de Princípios Processuais

Introdução A audiência de conciliação é um dos pilares do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015), idealizada para fomentar a cultura da pacificação social. No entanto, a imposição rígida deste ato processual tem gerado debates acalorados na comunidade jurídica. Muitos advogados e juristas questionam se a obrigatoriedade indiscriminada não acaba por configurar uma verdadeira […]

A Coação à Participação em Audiências de Conciliação e a Violação dos Princípios da Voluntariedade, Economia Processual, Celeridade e Colaboração

Sumário

Introdução

A audiência de conciliação é um dos pilares do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015), idealizada para fomentar a cultura da pacificação social.

No entanto, a imposição rígida deste ato processual tem gerado debates acalorados na comunidade jurídica.

Muitos advogados e juristas questionam se a obrigatoriedade indiscriminada não acaba por configurar uma verdadeira coação.

Afinal, forçar as partes a comparecerem a um ato, quando manifestamente não há interesse em transigir, fere a lógica do sistema?

Neste artigo, analisaremos como essa imposição pode violar os princípios da voluntariedade, da economia processual e da celeridade, transformando uma ferramenta de solução em um entrave burocrático.

A Obrigatoriedade no CPC/2015 e seus Limites

O artigo 334 do CPC estabelece que a audiência de conciliação deve ser designada em quase todos os processos. Contudo, a norma prevê exceções, especificamente quando ambas as partes manifestam, expressamente, o desinteresse na autocomposição.

O Princípio da Voluntariedade

A essência da conciliação reside na autonomia da vontade. Portanto, obrigar o comparecimento sob pena de multa (ato atentatório à dignidade da justiça) quando não há ânimo de acordo é contraditório.

A voluntariedade é um requisito intrínseco para que a mediação ou conciliação seja frutífera.

Dessa forma, a “coação” estatal para o comparecimento esvazia o sentido do instituto. Se uma das partes já sinalizou que não fará acordo, a insistência do Judiciário viola a liberdade processual.

Violação da Economia Processual e Celeridade

Além da questão da vontade, há o impacto prático. A realização de uma audiência de conciliação fadada ao fracasso onera o tempo do processo e os recursos do Judiciário.

  • Morosidade: O agendamento de audiências em pautas congestionadas atrasa a marcha processual em meses.

  • Custos: Movimenta-se a máquina judiciária, conciliadores, advogados e partes para um ato inócuo.

  • Desgaste: Aumenta o atrito entre as partes, violando o princípio da colaboração.

Nesse sentido, a insistência em audiências meramente protocolares afronta diretamente o princípio constitucional da razoável duração do processo e da eficiência.

Posicionamento Doutrinário e Jurisprudencial

A doutrina moderna tem alertado para o perigo da “conciliação a qualquer custo”. Juristas como Fredie Didier Jr. destacam que a autocomposição deve ser estimulada, mas nunca imposta de forma autoritária em detrimento da lógica processual.

Jurisprudência Recente

Os tribunais vêm flexibilizando a regra do art. 334. Veja-se o entendimento que vem se consolidando:

“Não se justifica a realização de audiência de conciliação quando as partes, desde o início, demonstram total desinteresse na composição, sob pena de violação aos princípios da celeridade e economia processual.” (Entendimento aplicado em diversos julgados do TJSP e TJMG).

[Link para jurisprudência relacionada no Jusbrasil]

Portanto, magistrados têm dispensado o ato quando percebem que sua realização servirá apenas para procrastinar o feito, sem qualquer benefício prático para a resolução do mérito.

Análise Prática: O Papel do Advogado

Para o advogado, o desafio é demonstrar ao juízo que a dispensa da audiência de conciliação é a medida mais adequada ao caso concreto.

Recomenda-se:

  1. Peticionar de forma clara, fundamentando na ausência de animus de transigir.

  2. Invocar os princípios da celeridade e economia processual.

  3. Demonstrar que a insistência configura constrangimento desnecessário às partes.

Conclusão

A audiência de conciliação é um instrumento valioso, mas não pode ser transformada em fetiche processual.

A coação para a participação em atos estéreis viola os princípios da voluntariedade, economia e celeridade.

Cabe aos operadores do direito lutar pela racionalização do processo, garantindo que a busca pela paz social não se torne, paradoxalmente, um instrumento de ineficiência e coerção estatal.

ASSINE NOSSA NEWSLETTER

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Gostou do artigo A Coação na Audiência de Conciliação e a Violação de Princípios Processuais Compartilhe…

Continue lendo outros artigos relacionados:

Smartphone com cadeado digital simbolizando o sigilo das conversas de WhatsApp entre advogados
Artigos Jurídicos

Conversas de WhatsApp entre advogados: Infração Ética

A fronteira entre a defesa combativa e a infração ética tornou-se tênue na era digital. Recentemente, o Tribunal de Ética e Disciplina (TED) da OAB/SP reafirmou uma diretriz importante. O Tribunal entende que utilizar conversas de

Leia Mais »
×